PADRE-ALGUMA-COISA

Os tempos modernos trouxeram à tona uma nova modalidade de sacerdotes. Falo, sobretudo, daqueles que se destacam na mídia por conta de algum tipo de atuação nos meios de comunicação social. Longevo nessa seara temos o conhecido e querido Pe. Zezinho, SCJ. Seu trabalho de evangelização através da música, de artigos e livros publicados, é mais que louvável. O mesmo podemos dizer do incomparável Pe. Jonas Abib, fundador do complexo Canção Nova.

Na última década do século passado surgiu o fenomenal Pe. Marcelo Rossi. Antes professor de educação física, ele conquistou muitos com suas "aeróbicas" para o Senhor. Suas missas transmitidas no rádio e televisão, bem como CD's e livros também evangelizaram muita gente. E sim, por mais que alguns pensem o contrário, trouxeram de volta inúmeros fiéis até então afastados da Igreja.

Há em voga uma tendência que vem se acentuando: a de que o padre necessita ser, para o público, alguma coisa a mais. Como se o fato de já ser um sacerdote não bastasse por si. Além do padre-cantor e do padre escritor, começaram a aparecer o padre-psicólogo, o padre-coaching, o padre-animador-de-auditório, o padre-do-tiktok, etc. Sobre isso, vale a pena refletir sobre alguns pontos.

Primeiramente, há pessoas chamadas ao sacerdócio que já exerceram alguma atividade antes e que podem sim colocar seus conhecimentos a serviço da Igreja. Um psicólogo que se torne padre pode e deve ajudar na formação dos seminaristas e certamente o povo também. Um sacerdote com experiência em engenharia civil e construção, pode colocar seu conhecimento na área a serviço da comunidade. Um padre com formação em contabilidade ou economia, pode auxiliar na administração da paróquia e até mesmo da diocese.

Até aí, nada de mais. Não se pode, após o sacerdócio, simplesmente jogar fora a experiência acumulada ou os dons recebidos de Deus. São talentos a serviço do Evangelho e abafar isso seria colocar o candelabro aceso debaixo da cama. O problema não está em o padre ser arquiteto de formação. A questão não o sacerdote que entende e também atua na medicina, no direito ou na educação.

A questão é o padre priorizar e continuar exercendo fielmente aquilo para o que foi chamado na vocação, ou seja, o sacerdócio. A priori, o padre não precisa ser mais nada. Já exerce a mais nobre e importante função que um homem pode querer, que é ser um outro Cristo para os outros. O papel do sacerdote, que deve ensinar, governar e santificar os fiéis é muitíssimo mais valoroso que outras funções e jamais pode ser equiparada a uma profissão, no sentido de que não é um trabalho, mas uma Missão.

O problema é quando o padre-cantor, para cantar, deixa de celebrar a Santa Missa. O problema é quando o padre-escritor, para escrever, deixa de atender confissões. O problema é quando o padre-psicólogo começa a colocar Freud no lutar da Teologia ou quando o padre-administrador passa a se preocupar muito mais com balancetes do que com a oração. O problema é quando o padre, em vez de dar testemunho do Evangelho ao mundo, resolve apenas adequar-se a ele e às modinhas terrenas.

Embora não pareça, trata-se de uma questão complexa. Primeiro porque nem todos os sacerdotes percebem isso em suas próprias vidas. Depois porque o povo, esse sim, percebe logo. É tênue a linha que separa o interesse pessoal dos deveres sacerdotais. Neste mundo pós-moderno, no qual quase nada mais parece preto ou branco, somos obrigados a lidar com muitas áreas cinzentas. É claro que, de certa forma, isso atingiria a classe sacerdotal.

Esses exemplos que eu dei são todos genéricos. Creio que a maioria dos sacerdotes são felizes por serem padres e sabem também colocar a serviço de todos outros dons e experiências profissionais. Aprendi com meu tutor e pai espiritual, Dom Amaury Castanho, a devida proporção das coisas. Sou hoje um padre, jornalista e professor de formação, como ele o foi.

Continuo escrevendo e lidando com os meios de comunicação social. E para isso utilizo o meu tempo livre, que organizo bem. Uso ainda as imprevisíveis insônias, que às vezes aparecem. Mas deixar de rezar a Santa Missa, de atender algum fiel, de fazer minhas orações pessoais e leituras espirituais para tão somente me dedicar ao jornalismo? Ah, isso não. Se fosse para isso, continuaria jornalista e nem precisaria ser padre. Além disso, o sacerdócio é infinitamente mais importante. O desafio é não perder as proporções, o censo de importância da missão sacerdotal.

Como sempre faço (quem me conhece, o sabe) peço a todos que rezem por nós, sacerdotes. Não é fácil... A sociedade moderna, ateísta e materialista, deu um jeito de depreciar essa nobre função. Os inimigos da Igreja estão ativos como nunca, usando qualquer pretexto e inventando mil outros, para atacar os padres em geral. A peleja é bravíssima e a oração do povo ajuda a nos sustentar.

Que o Espírito Santo continue iluminando os sacerdotes para que, além de bem exercerem sua missão enquanto padres, saibam utilizar corretamente os outros dons que, certamente, Deus lhes concedeu para serem colocados a serviço e em benefício da Igreja e do povo.

Amém

(Pe. Sala é jornalista e escritor, professor e teólogo, membro da Academia Ituana de Letras)

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