A DOR NOSSA DE CADA DIA
O sofrimento é uma realidade na vida de todos os seres humanos. Nunca houve, em toda a história da humanidade, algum de nós isento de dores. Nem mesmo Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro ser humano, foi preservado de momentos extremamente dolorosos.
Se o Nazareno era divino, por que aceitou a dor? Primeiro, para não usar sua divindade como desculpa de vantagem. Depois, para não se apartar de nós, que sofremos diariamente. E também para pagar, com os seus sofrimentos, o preço dos nossos inúmeros pecados.
A Quaresma é este tempo litúrgico que nós chamamos de "forte", por causa da importância que carrega. É o período do ano no qual os católicos se debruçam com maior afinco sobre o mistério do sofrimento na nossa e na vida de Cristo. Não à toa, o tempo quaresmal reveste todas as liturgias com a cor roxa: a matiz do sofrimento, da dor, do hematoma e do machucado.
Conforme rezamos na oração da Salve-Rainha, vivemos por enquanto neste "vale de lágrimas". É por misericórdia divina que experimentamos algumas alegrias já nesta porca vida. Porém, cada um precisa reconhecer: nossa existência é feita muito mais de preocupações, dores e angústias que de gozos, alegrias e tranqüilidades.
Claro que nossa vida na terra não é uma droga total por causa dos sofrimentos. Mas estamos todos, pela Fé, vislumbrando a vida futura na eternidade celeste: uma existência tranqüila e feliz na morada que o Pai reservou aos que perseverarem até o fim. Um lugar sem choro, sem lágrimas. Isso sim é que será uma verdadeira vida!
Enquanto a realidade futura da eternidade não chega, é necessário carregar a cruz de cada dia (às vezes, até mesmo no plural). O verdadeiro discípulo de Cristo utiliza o sofrimento em favor dos irmãos e de si mesmo. Para o cristão, o sofrer não é algo banal mas sim uma alavanca que impulsiona ao céu.
Jesus sofreu, de uma vez só, durante sua primeira passagem por esta terra, por causa dos nossos pecados. Nós, que somos covardes e fracos demais, jamais poderíamos beber do mesmo cálice de sofrimentos de Cristo. O Pai sabe disso. Por isso mesmo é que sofremos à semelhança de Jesus, porém em mais leves e suaves "prestações".
O sofrimento é "democrático" e "imparcial": atinge a todos sem qualquer distinção. Cada um de nós sabe das próprias dores: físicas, morais, espirituais, exteriores e internas, de cunho emocional ou psicológico, de ontem, de hoje e de sempre. No mar de sofrimentos formado pelas lágrimas humanas, estamos todos no mesmo barco, tentando fugir de um naufrágio total.
O que nos anima e nos faz persistir enfrentando a dor nossa de cada dia? É saber que o próprio Filho de Deus está ao nosso lado, como um colete salva-vidas. Mais que isso, Jesus sabe e entende do nosso sofrer. O próprio Cristo está ao lado dos que sofrem e que se unem a Ele em suas dores.
Quem entre lágrimas semeia, entre sorrisos colherá.
Enfrente suas dores. Ofereça-as a Cristo. Sofra por alguém, com e por amor.
Depois da cruz, virá a Ressurreição. Depois das dores, virá a alegria eterna.
Amém.
(Pe. Sala é jornalista e escritor, professor e teólogo, membro da Academia Ituana de Letras)